A Justiça Federal na Paraíba condenou Antonio Ais Neto, da Braiscompany, a 88 anos e sete meses de prisão. A esposa dele, Fabrícia Farias, foi condenada a 61 anos e 11 meses de prisão. A pena dos dois, somadas, chega a quase 150 anos de prisão. A sentença foi dada pelo juiz da 4ª Vara Federal em Campina Grande, Vinícius Costa Vidor.
Os dois também foram condenados, além de outros 8 réus, ao pagamento de R$ 277 milhões em danos patrimoniais e R$ 100 milhões em dano coletivo. Os outros réus condenados são: MIZAEL MOREIRA DA SILVA ( 19 anos e 6 meses); SABRINA MIKAELLE LACERDA LIMA ( 26 anos); ARTHUR BARBOSA DA SILVA ( 5 anos e 11 meses); FLÁVIA FARIAS CAMPOS ( 10 anos e 6 meses); FERNANDA FARIAS CAMPOS (8 anos e 9 meses); CLÉLIO FERNANDO CABRAL DO Ó ( 19 anos); GESANA RAYANE SILVA (14 anos e 6 meses); e DEYVERSON ROCHA SERAFIM (5 anos).
De acordo com a sentença do magistrado, eles deverão cumprir pena em regime inicialmente fechado, em estabelecimento a ser fixado pelo juízo da execução.
Antonio Ais Neto e Fabrícia Farias estão foragidos desde 16 de fevereiro, quando foi realizada a primeira fase da Operação Halving, da Polícia Federal.
O grupo respondeu por operar instituição financeira sem autorização, emissão, oferecimento ou negociação irregular de títulos ou valores mobiliários, atuação como assessor de investimento sem autorização, gestão fraudulenta, apropriação indébita financeira, lavagem de capitais, organização criminosa, obstrução da justiça em crimes de organização criminosa e falsidade.
Confira abaixo o que diz a sentença sobre o casal mentor e sobre os auxiliares da Braiscompany:
ANTÔNIO INÁCIO DA SILVA NETO
Mentor do esquema junto com a esposa, Fabrícia Campos, sendo o principal beneficiado. Foi dele a iniciativa de pactuação dos contratos sociais, o recrutamento dos outros envolvidos nos delitos, inclusive pessoas interpostas, a definição dos diretores e gerentes da empresa, a fixação de sua sede e dos demais estabelecimentos empresariais, o exercício dos poderes de administração interna, especialmente o controle do capital social e do financiamento da sociedade, a definição da forma fraudulenta de atuação da empresa, a emissão e negociação de valores mobiliários sem autorização e o estabelecimento de estrutura ordenada e estável para obter vantagem econômica em detrimento de seus clientes.
A sentença diz ainda que Antônio figurava, ostensivamente, na captação de novas vítimas e na divulgação da atividade desenvolvida pela empresa, mesmo quando tinha ciência de que os recursos arrecadados dos investidores não eram, de fato, devidamente empregados para a realização de operações de compra e venda de criptoativos para obter lucro (trades) como anunciado, mas que o montante recebido era utilizado, em sua essência, apenas para o pagamento de investidores anteriores, de brokers, de traders e sacados ou transferidos para os gestores da empresa ou terceiros a eles associados.
Foi o responsável direto pela gestão fraudulenta da Braiscompany, na medida em que criou diversos ardis ou artifícios para induzir e manter terceiros em erro, divulgando informações falsas sobre a natureza da atividade da empresa, sobre o resultado das operações realizadas, sobre o destino dos valores, sobre o patrimônio dos investidores que permanecia sob custódia e sobre as causas para os atrasos no pagamento, bem como fez uso de técnicas avançadas de marketing digital para dar a aparência de legitimidade ao esquema, como a divulgação de imagens com bens de alto valor, a associação com entidades de idoneidade reconhecida (OAB, associação de policiais federais), o uso indevido da logomarca de autarquia federal (Comissão de Valores Mobiliários) e o patrocínio de eventos públicos (como o São João de Campina Grande).
Também consta na sentença que Antônio adquiriu bens móveis e imóveis de grande valor, que realizou viagens
extravagantes e que adquiriu bens de luxo para consumo próprio ou de terceiros sem possuir qualquer outra fonte de recursos além da Braiscompany, bem como que se apropriou, por meios diversos, de dezenas de milhões de reais transferidos pelos clientes à empresa.
“Como apurado, o réu ANTÔNIO INÁCIO DA SILVA NETO controlava a movimentação financeira realizada pelos brokers, bem como se valia de pessoas interpostas para realizar operações em seu nome (tais como VICTOR HUGO LIMA DUARTE, GESANA RAYANE SILVA, FABIANO GOMES DA SILVA e JOEL FERREIRA DE SOUZA). Pelo estimado até o momento, provavelmente 16% do 1,1 bilhão de reais movimentados pelo esquema (176 milhões de reais) foram desviados diretamente em favor do réu, de sua esposa FABRÍCIA FARIAS CAMPOS e de pessoas próximas”, diz a sentença que condena os réus.
FABRÍCIA FARIAS CAMPOS
Fabrícia figura como mentora do esquema da Braiscompany junto com o esposo, Antônio Inácio Silva Neto. Era a titular da carteira de criptoativos utilizada para a captação e desvio dos recursos de investidores, tendo sido responsável pela movimentação de mais de um bilhão de reais. Foi demonstrado, ainda, que Fabrícia se valia das contas bancárias e carteiras de terceiros e de pessoas interpostas para movimentar os valores desviados, tendo sido demonstrado o controle direto e indireto das contas e carteiras de MIZAEL MOREIRA SILVA e SABRINA MIKAELLE LACERDA LIMA. Fabrícia também atuou na pactuação dos contratos sociais, no recrutamento dos demais envolvidos nos delitos, inclusive pessoas interpostas, na definição dos diretores e gerentes da empresa e na fixação de sua sede e dos demais estabelecimentos empresariais, exercendo poderes de administração superiores aos diretores financeiro e operacional da empresa. Semelhante ao esposo, também atuou para atrair novas vítimas ao esquema. Parte do ardil usado para mascarar a fraude passava exatamente pela informação falsa de que Fabrícia seria uma operadora experiente do mercado de criptoativos e de que suas operações de compra e venda (inexistentes) seriam responsáveis pelo lucro da empresa, dado que as operações efetivamente realizadas pelos traders não produziam esse resultado. Ela atuou tanto na divulgação de informações falsas sobre a natureza da atividade da empresa e sobre o resultado das operações realizadas quanto no uso de técnicas avançadas de marketing digital para dar a aparência de legitimidade ao esquema.
A relação pessoal dela com os fatos sob investigação também fica reforçada pela presença de familiares próximos no esquema, bem como na transferência de recursos para eles.
Sobre a lavagem de capitais, há prova de que Fabrícia participou dos atos de branqueamento levados a efeito quando da alienação de aeronave, dado que participou ativamente da negociação referente à dissimulação de origem de cinco milhões de reais, conforme mensagens obtidas durante a investigação. Para além dos crimes individualmente praticados, verificou-se que ela exerceu função permanente de mentora e chefe de organização criminosa, direcionando a ação dos operadores ou executores materiais e cooptando as pessoas interpostas para a prática de milhares de delitos.
E, de modo a embaraçar a investigação conduzida pela Polícia Federal, ocultou/ destruiu provas relevantes dos crimes praticados quando de sua evasão para fora do país. Como destacado, os dados e comunicações mantidos apenas no aparelho celular de Fabrícia Farias Campos jamais foram obtidos pelo ato de ocultação/ destruição realizado.
MIZAEL MOREIRA SILVA
Era diretor operacional da Braiscompany, detendo poderes de gestão dentro da empresa; era sócio de uma das pessoas jurídicas constituídas pelo grupo criminoso, conjuntamente com ANTÔNIO INÁCIO DA SILVA NETO e FABRÍCIA FARIAS CAMPOS (GERACAO CRYPTO TREINAMENTOS E CURSOS LTDA) e era o segundo maior responsável pela movimentação, desvio e apropriação dos valore captados com o público investidor.
Movimentou em sua carteira pessoal de criptoativos mais de 200 milhões de reais, tendo recebido pouco mais de 102 milhões e transferido mais de 92 milhões entre 2019 e 2022. Deste montante, 30 milhões foram transferidos da carteira titularizada por FABRÍCIA FARIAS CAMPOS, para a qual foram enviados 12 milhões.
O envolvimento de Mizael com o esquema criminoso vem do início, dado que não informou e-mail pessoal na abertura de sua conta na Binance, mas e-mail de titularidade de FABRÍCIA FARIAS CAMPOS (fabricianetodreams2@gmail.com) e que confirmou a titularidade da conta por meio de foto própria enviada em 2019, quando iniciou a movimentação expressiva da carteira. De acordo com o registro das transações realizadas, as carteiras titularizadas por MIZAEL MOREIRA SILVA e FABRÍCIA FARIAS CAMPOS eram os principais destinos dos valores repassados pelos traders da empresa, a indicar que esta era utilizada diuturnamente como o meio de distribuição de ativos entre os associados ao esquema criminoso.
A sentença aponta a alta remuneração recebida pelo diretor operacional (registrada, em troca de mensagens com FABRÍCIA FARIAS CAMPOS, como sendo de R$ 17.000,00).
Por fim, acerca da apropriação dos valores desviados de clientes, registre-se que as contas bancárias de titularidade do réu MIZAEL MOREIRA SILVA receberam da empresa BRAISCOMPANY, entre 2021 e 2022, aproximadamente seis milhões de reais, montante incompatível com o resultado das operações de compra e venda (trades) realizadas pelo mesmo que, como visto, resultaram em prejuízo, e com a alegada função secundária na empreitada criminosa.
SABRINA MIKAELLE LACERDA LIMA – Laranja para a lavagem de, pelo menos, cinco milhões de reais.
ARTHUR BARBOSA DA SILVA – Ajudou na ocultação/destruição de provas praticados pelos réus ANTÔNIO INÁCIO DA SILVA NETO e FABRÍCIA FARIAS CAMPOS, na medida em que conduziu o casal de seu domicílio em São Paulo até a Argentina, mesmo após ter sido impedida viagem anterior a Dubai por decisão judicial. Também auxiliou na entrada de Antonio e Fabrícia com o passaporte de terceiros e que retornou ao Brasil de modo a obter acesso a bens do casal custodiados em depósito no Rio Grande do Sul, bens estes que não foram devidamente identificados.
Comprovou-se, ainda, que concordou com a tentativa de transferência dos veículos Mercedes Benz Sprinter e Toyota Hilux para sua propriedade, para ocultar a sua origem e impedir que fossem objeto de medidas judiciais, além de futuramente viabilizar a sua transferência a terceiro, em operação intermediada por ANTÔNIO INÁCIO DA
SILVA NETO e FABIANO GOMES DA SILVA.
Constatou-se que Arthur exercia função relacionada à gravação e postagem de mensagens em mídias sociais, serviços domésticos e de motorista, e atuação no marketing da empresa.
FLÁVIA FARIAS CAMPOS – diretora financeira da Braiscompany. Observa-se, indícios indiretos de poderes de gestão, decorrente da elevada remuneração pelo exercício do cargo (declarada como sendo de R$ 20.000,00). Foi identificado que era titular de carteira de criptoativos que recebeu o equivalente a pelo menos 463 mil reais e foi beneficiada com 301 operações entre outubro de 2019 e janeiro de 2023, a maioria oriunda da conta de FABRÍCIA FARIAS CAMPOS e o restante da conta de MIZAEL MOREIRA SILVA, em montante descorrelacionado com o salário declarado e proveniente de recursos desviados de clientes).
FERNANDA FARIAS CAMPOS – auxílio aos atos de ocultação/destruição de provas praticados por Antônio Neto e Fabrícia Campos. Entregou o seu passaporte a Fabrícia para viabilizar a sua fuga e iludir as autoridades aduaneiras. Ainda prestou informação falsa em boletim de ocorrência policial, uma vez que declarou a perda do passaporte em novembro de 2022, fato sabidamente inverídico.
CLÉLIO FERNANDO CABRAL DO Ó – A sentença diz que ele atuou como o maior broker da empresa BRASCOMPANYY, tendo sido responsável pela captação e gestão de carteira de mais de oitenta e seis milhões de reais (parte dos documentos apreendidos mencionam uma carteira de cento e quatorze milhões).
“A quebra do sigilo bancário revelou que o réu movimentou, em sua conta pessoal, entre 2021 e 2023, quase dez milhões de reais, montante cinco vezes maior que a movimentação dos anos anteriores, reforçando a sua atuação na captação, intermediação e aplicação de recursos financeiros, conduta que é considerada típica mesmo isoladamente, na forma do inciso II do parágrafo único do art. 1º da Lei n. 7.492/1986”, diz trecho da sentença.
GESANA RAYANE SILVA – Atuou como broker, tendo sido responsável pela captação e gestão de carteira de mais de treze milhões de reais.
DEYVERSON ROCHA SERAFIM – Coautor relativamente ao crime de lavagem de capitais praticado para fins de ocultação e posterior transferência a terceiros do veículo Evoque placas OYY2H07 pelo fato de o mesmo estar na posse do bem quando de sua apreensão pela Polícia Federal, em condições anormais e mesmo após a ciência da ordem de apreensão dos bens provenientes da atividade criminosa.