O presidente Lula (PT) intensificou a costura de alianças para as eleições deste ano nas capitais e indicou que pretende se empenhar nas disputas onde houver cenário claro de polarização, opondo um candidato de sua base a outro ligado a Jair Bolsonaro (PL).
Lula deve centrar forças em capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e Porto Alegre, onde se desenham disputas entre lulistas e bolsonaristas, a despeito de haver mais de uma candidatura de aliados do petista.
O movimento foi indicado pelo próprio Lula em entrevista na semana passada ao falar sobre o apoio ao deputado federal Guilherme Boulos (PSOL) na capital paulista.
“Na capital de São Paulo é uma coisa muito especial. Uma confrontação direta entre o ex-presidente e o atual presidente, é entre mim e a figura [Bolsonaro]”, disse Lula à rádio Metrópole, de Salvador.
O PT não lançará candidatura à Prefeitura de São Paulo pela primeira vez. Nesta sexta (2), a ex-senadora Marta Suplicy retornará ao partido após movimento articulado por Lula. A chapa Boulos-Marta enfrentará Ricardo Nunes (MDB), que negocia o apoio do PL e de Bolsonaro.
No Rio e no Recife, a ordem é fortalecer o campo lulista com o apoio a aliados. O PT busca a indicação para vice de Eduardo Paes (PSD) e João Campos (PSB) de olho nas eleições de 2026, quando os atuais prefeitos poderão renunciar para disputar o governo.
No Rio, a resistência esbarra no próprio Paes, que tem indicado preferência por um nome do seu entorno. O PT segue insistindo, mas sem tensionar: “Estaremos com o prefeito, mas queremos mostrar que com o PT na vice ele fica mais competitivo”, afirma o presidente do PT do Rio, João Maurício de Freitas.
O candidato do PL no Rio tende a ser um nome próximo a Bolsonaro. O do deputado federal Alexandre Ramagem, alvo de operação da Polícia Federal sobre um suposto esquema de espionagem ilegal de opositores e autoridades, agora está em xeque.
Em viagem a Pernambuco em janeiro, Lula defendeu à cúpula do PT estadual que siga em busca da vice na aliança com João Campos (PSB). O presidente ainda orientou, em encontro reservado, que o partido converse diretamente com o prefeito sobre as eleições de 2026.
Os petistas, contudo, dizem acreditar que o PSB só entregará a vice ao PT em caso de pedido direto de Lula.
O principal opositor de João Campos no Recife deverá ser o ex-ministro do Turismo do governo Bolsonaro Gilson Machado Neto. A expectativa é que o ex-presidente viaje ao Recife até março para lançar a pré-candidatura oficialmente.
Em Porto Alegre, a candidatura da deputada Maria do Rosário (PT) representa uma aposta dobrada na polarização nacional, graças aos embates de décadas dela com Bolsonaro e à aproximação do atual prefeito, Sebastião Melo (MDB), com o bolsonarismo.
Rosário deverá ter como vice Tamyres Filgueira, do PSOL. PT e PSOL comemoram a decisão de Lula de não ungir mais Manuela D’Avila (PC do B) à prefeitura, que concorreu em 2020 com a bênção do PT, mas decepcionou o presidente ao se recusar a concorrer ao Senado em 2022.
Melo vinha construindo uma chapa ampla para si, mas cresceram nas últimas semanas conversas por uma terceira via ao gosto do governador Eduardo Leite (PSDB), que poderia ter PDT e PSB em torno de uma mulher: Nadine Anflor (PSDB), ex-chefe de polícia, ou Any Ortiz (Cidadania), ambas deputadas estaduais.
Curitiba é uma das capitais em que a orientação de Lula pode ser fundamental para manter coesa a frente ampla que o elegeu. Embora o PT tenha pré-candidatos, ele pode se ver obrigado a ceder a cabeça de chapa para o ex-prefeito Luciano Ducci (PSB) ou o deputado estadual Goura (PDT), segundo colocado em 2020.
A situação no Paraná, que hoje tem o vice-prefeito Eduardo Pimentel (PSD) e o ex-governador Beto Richa (PSDB) pode bagunçar caso Deltan Dallagnol (Novo) consiga se lançar ou viabilizar sua mulher, Fernanda Dallagnol, filiada ao Novo recentemente. Salvo outro entendimento da Justiça Eleitoral, Deltan ficou inelegível ao ter o mandato de deputado federal cassado.
Em Cuiabá, há movimento oposto. Lula entrou em campo para fortalecer o nome do deputado estadual Lúdio Cabral (PT) com apoio do PSD, partido do ministro da Agricultura Carlos Fávaro. Apesar da força do bolsonarismo no estado, a direita está rachada na disputa pela sucessão de Emanuel Pinheiro (MDB).
Algo parecido pode ocorrer em Goiânia, onde o senador Vanderlan Cardoso (PSD), pré-candidato e outrora bolsonarista, ensaia aproximação com a candidatura de Adriana Accorsi (PT), deputada federal.
Enquanto intensifica as articulações nas cidades onde se desenha um cenário de polarização, Lula adota uma postura mais cautelosa em cidades que vão protagonizar uma disputa entre partidos aliados.
É o caso de Salvador, onde o prefeito Bruno Reis (União Brasil) vai enfrentar o vice-governador Geraldo Júnior (MDB), que terá o apoio do PT.
Adversários na Bahia, os dois partidos fazem parte da base no Congresso. Bruno Reis negocia apoio do PL de Bolsonaro, mas trabalha por uma frente com outras legendas aliadas de Lula como PDT, PP e Republicanos.
Em visita à Bahia na última semana, Lula indicou apoio a Geraldo Júnior, mas escorregou ao ser questionado sobre sua participação na campanha. “Temos que colocar o pé na realidade. Não posso, como presidente da República, fazer campanha como se fosse um cidadão comum. Se tiver dois candidatos da base do governo disputando uma eleição, eu tenho que dar um tratamento mais respeitoso, eu não posso ser acintoso no apoio a um candidato nosso”, disse.
Esse cenário deve se repetir em outras cidades como Fortaleza, Belém, João Pessoa e Aracaju. Na capital cearense, Lula só deve se engajar na campanha do PT num eventual segundo turno contra Capitão Wagner (União Brasil), aliado de Bolsonaro.